domingo, 12 de junho de 2011

Pequenas histórias de um ex-combatente

Joaquim José Alves nasceu, em 1940, na cidade de Castelo Branco.
Foi para a tropa, como voluntário, para o Regimento de Cavalaria n.º 8. Aos 28 meses de tropa, foi mobilizado para Angola, fazendo parte do Batalhão de Caçadores 155/CCS Ex-RI-16 . Estes Batalhões eram formados por dez pessoas de cada quartel do país.
A sua mobilização teve início, em Évora, a 28/05/1961, de onde saíram para Lisboa. Aí apanharam o barco, com o nome de Niassa, direitos a Angola.
Este era um barco de carga muito velho, com condições limitadas e pobres. O meu avô só entrava nos porões, para dormir, devido ao cheiro a vomitado. O melhor que se comia, no barco, era fruta e, em troca de fruta, tinha comida caseira, que os colegas levavam na bagagem.
A viagem demorou cerca de um mês, que foi o que mais custou a todos. Durante a viagem, houve muitos que adoeceram, mas felizmente o meu avô não foi um deles, devido a ter levado uma boa alimentação, como queijos, chouriços e boa cerveja alemã que o fortaleceu, caso contrário teria adoecido, pois a comida do barco era uma lástima.
Quando chegou a Luanda, foram dormir para um seminário. Ao terceiro dia, arrancaram para o norte de Angola, onde, antes de chegarem a Salazar, o meu avô escavacou um jipão. A estrada estava coberta de árvores cheias de macacos selvagens, distraiu-se a olhar para eles e, quando travou, não tinha travões, o que levou o jipão a capotar.
Passaram por Carmona direitos ao Songo, onde esteve, com o seu pelotão, acampados dezassete meses. Muitos dormiam em capelas, escolas e armazéns antigos de café.
No primeiro dia em que chegaram a Songo, iam matando o meu avô. Um civil, com uma carabina de cinco balas, disse que podia mexer na arma à vontade, que estava travada e, após o meu avô lhe mexer, um colega do seu batalhão carrega no gatilho, saindo uma bala que toca de raspão na cabeça de o meu avô. Felizmente, não teve ferimentos graves.
Algumas das baixas que tiveram, no Songo, faram mortos pelos próprios colegas, devido à má organização. Um dos acidentes que tiveram com uma patrulha foi a morte de um furriel miliciano que não levava capacete.
Ao fim de dezassete meses, foram transferidos para Uqua. Nesta aldeia, foram proibidos de tirar fotografias e de andarem armados. O meu avô tinha um rolo de fotografias que pertencia ao furriel miliciano que morrera. Havia carros que iam todos os dias a Luanda e ele, em vez de mandar revelá-lo pelos colegas, mandou-o por um civil. A polícia militar apanhou-o e apreendeu o rolo, o civil teve que dizer a quem este pertencia.
No fim de uma semana, o meu avô foi chamado ao capitão da companhia, que o avisou que tinha que ir ao Comandante e que provavelmente seria preso. O capitão aconselhou-o a cortar a barba, pois a sua barba ainda não tinha sido cortada desde a sua partida de Lisboa. Cortá-la foi o que lhe valeu o perdão.
Parte do seu serviço, em Uqua, era acompanhar à frente as colunas civis. O camião ia sempre cheio de sacos de areia. Numa dessas viagens, passou por cima de uma jibóia. O meu avô parou, para a apanhar. Nisto, os civis agarram-se a ele, por ter parado, devido a elas ficarem agarradas à carroçaria e matarem os motoristas.
Seis meses mais tarde, foram para o sul de Angola, direitos a Lobito, de Lobito a Nova Lisboa e de Nova Lisboa para Henrique de Carvalho, quase aos vinte e nove meses é que voltaram a casa, no velho Niassa.                  

O meu avô


O velho Niassa


A entrada do Niassa

O jipão

A cobra do Uqua



Bruno Barata

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